quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

A derrota da vitória

No sábado passado eu estava vendo televisão e ao passear pelos canais parei um instante num que apresentava um programa de um pastor da tv, o R. R. Soares, que estava falando sobre Jacó e como Deus havia dado a Ele a vitória. Depois ele emendou algo parecido com “se você está com problemas financeiros confie em Deus que ele lhe dará a vitória, acabando com suas dívidas e lhe dando prosperidade”. Ele apenas me recordou algo que eu tenho percebido já há algum tempo, a derrota da vitória dentro da perspectiva do evangelho.

Explico: como pode notar a frase nada mais é que um paradoxo, algo aparentemente contraditório. Entretanto tenho percebido que muitas pessoas que freqüentam as mais diversas Igrejas cristãs ou pseudo-cristãs compreendem a vitória como algo bem triunfalista, imbatível, inclusive lembrei até do trechinho de uma música daqueles grupos infantis tipo Balão Mágico senão o mesmo: “eu tenho a força, sou invencível...”, onde a vitória nada mais é que a garantia de “levar vantagem em tudo, certo? Em nome de Jesus!”, como se Deus privasse aqueles que lhe pertencem de dificuldades, dor, vergonha, angústia, depressão e humilhação.

Essa é a derrota da vitória, essa interpretação errônea, superficial e rala que muitos fazem dela no contexto do evangelho. É óbvio que no contexto da nossa sociedade global vitória nada mais é que a plena sobreposição sobre o outro em qualquer aspecto da vida, seja ele o relacional, profissional, comunitário, etc. Em nosso tempo a violência por mais que seja criticada é muito valorizada, juntamente com a exarcebada sensualidade exibida em séries norte-americanas, filmes franceses e italianos, novelas brasileiras, hqs inglesas, vídeo-clipes indianos e mangás japoneses. Sim, a sedução é um dos elementos da vitória dentro da perspectiva do pensamento de nossa época. Nem vou escrever sobre o carisma, pois não há muito o que escrever. Basta que alguém muito carismático apareça para arrastar milhares de seguidores não importando o seu discurso e muito menos o seu fingido comportamento. A ascensão financeira por meio das “bênçãos determinadas” é um ótimo sinal de que o evangelho foi pro ralo, pois não importa se ela é conquistada por meio da exploração do outro, como dita a cínica cartilha capitalista, o que importa é se ela é rentável e se gera um rápido retorno positivo.

Ás vezes me pergunto se apenas eu e meia dúzia de iluminados está lendo a bíblia e interpretando um Jesus Cristo apontando para uma outra direção, uma outra proposta em relação a nossa época. No Reino de Jesus o cara que encontra a felicidade é àquele que confessa a necessidade de se relacionar com o seu criador, por ser pobre de espírito, ou seja, falido espiritualmente por ser pecador e não o cara que gera um frisson quando passa rapidamente em algum lugar, prometendo “bênçãos e curas”. Ainda sobre o discurso de Jesus no início do capítulo 5 do evangelho de Mateus fico impressionado quando ele declara que os que choram, os que trabalham pela paz, os que têm sede de justiça (no Brasil eles estão em extinção) e os que são perseguidos por viverem as verdades do evangelho são as pessoas que realmente encontraram a felicidade. No manual da felicidade de nosso tempo os felizardos são àqueles que possuem muitos bens e muito dinheiro, que satisfazem seus desejos quando o querem, que subjugam os outros, os dominam e os que são assediados e desejados por todos.

Honestamente, quais são os elementos que você consegue facilmente visualizar nas comunidades cristãs que você conhece?

A vitória na perspectiva de Deus é algo muito diferente da nossa perspectiva. Enquanto nossa visão é muito parecida com o desfile de um general romano apresentando os despojos das batalhas que venceu para o seu imperador sendo saudado pelo povo eufórico, a de Deus é de um homem ensangüentado, humilhado, desprezado, pendurando numa rústica cruz no meio de 2 ladrões. Esse é o pódio de Deus, a entrega total com conseqüências terríveis motivadas pelo amor. Como bem disse alguém “sem morte não há ressurreição”.

Acredito que necessitamos rever no que está alicerçada a nossa fé...